O Superior Interesse da Criança
"A criança gozará de protecção especial e deverão ser-lhe dadas oportunidades e facilidades através da lei e outros meios para o seu desenvolvimento psíquico, mental, espiritual e social num ambiente saudável e normal e em condições de liberdade e dignidade. Na elaboração das leis com este propósito, o superior interesse da criança constituirá a preocupação fundamental."
Princípio 2º da Declaração dos Direitos da Criança de 1959
"Todas as decisões relativas a crianças, adoptadas por instituições públicas ou privadas de protecção social, por tribunais, autoridades administrativas, ou órgãos legislativos, terão primacialmente em conta o interesse superior da criança."
Artigo 3º da Convenção sobre os Direitos da Criança de 1989
O Instituto de Apoio à Criança e um conjunto de personalidades levaram a cabo uma reflexão sobre o conceito legal de interesse superior da criança, enquanto sujeito autónomo de direitos.
A propósito de diversas e sucessivas decisões, quer administrativas, quer judiciais tornadas públicas, a sociedade portuguesa tem sido confrontada com apreciações divergentes sobre o conteúdo do conceito legal de “interesse superior da criança”, traduzidas em interpretações opostas dos preceitos legais, circunstâncias que não favorecem, antes colidem com a necessidade de garantir a segurança jurídica, valor essencial num Estado de Direito.
O princípio do “interesse superior da criança” é fundamental no sistema jurídico do nosso País e consta dos textos convencionais mais relevantes sobre a criança, considerada hoje sujeito de direito e de direitos, designadamente do artº 3º da Convenção sobre os Direitos da Criança, que em 20 de Novembro de 2007 completou 18 anos.
A legislação nacional, os direitos e os conceitos de perigo e de superior interesse da criança
Na busca da concretização do mencionado princípio, tem-se procurado enunciar o conjunto de direitos da criança cuja violação ou desrespeito permite antever uma situação de prejuízo ou perigo, por forma a ponderar se a sua verificação merece, designadamente, a aplicação de medidas de protecção que afastem o perigo para a saúde, segurança, formação moral ou educação da criança, sempre visando a prossecuçãodo seu desenvolvimento integral, bem jurídico garantido pelo artº 69º da Constituição da República.
O Código Civil prevê, por isso, nos artºs1913º e segs., não só a inibição do exercício do poder paternal, aplicável nos casos mais graves de violação culposa dos deveres parentais que causaram sérios prejuízos ao filho, mas também medidas limitativas para os casos em que se observe o perigo, mas não seja adequada a inibição, nomeadamente para situações em que não se observe a culpa.
Quer a limitação, quer a própria inibição do exercício do poder paternal podem ser requeridas pelo Ministério Público, pelos familiares da criança e pelas pessoas a quem tenham sido confiadas de direito ou de facto, como estatuem os artºs 1915º e 1918º do Código Civil.
Tais medidas limitativas estão hoje previstas na Lei de Protecção das Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei nº 147/99, de 1 de Setembro e visam a promoção dos direitos da criança e a sua protecção. A Lei de Protecção atribui ao Ministério Público amplos poderes funcionais, designadamente no que tange à iniciativa processual.
É, sem dúvida uma lei inovadora na busca da definição de princípios orientadores da intervenção, que se fundam na promoção dos direitos da criança, procurando também enunciar, de uma forma aberta, um conjunto de situações reveladoras de perigo, as quais, por consubstanciarem sempre violação ou perigo de violação de direitos da criança, legitimam a intervenção do Estado na família.
Tais princípios orientadores são hoje aplicáveis a todos os Processos Tutelares Cíveis, por força do artº 147º-A da Organização Tutelar de Menores.
No entanto, não obstante este normativo, nem sempre aqueles princípios são tidos em consideração, circunstância que, em particular nas acções de regulação do exercício do poder paternal, pode prejudicar a melhor avaliação das situações fácticas em apreciação nesses processos.